“Falta de Literacia ou Falta de Democracia?”

Em recente audiência com o Secretário de Estado Adjunto e da Defesa Nacional (SEADN), os dirigentes da ANS presentes foram colocados perante uma situação que, não sendo nova, continua a provocar muita perplexidade e até indignação.
Numa altura em que a actualização do suplemento de risco para as Forças de Segurança se encontra em negociação entre o governo e as estruturas associativas e sindicais representativas desses profissionais, o SEADN, logo no início da audiência, transmitiu que nada teria para dizer nesta audiência e que estaria ali para ouvir os representantes da ANS, acrescentando que há assuntos que estão a ser debatidos entre o MDN e as Chefias militares e que, posteriormente, nos dariam conhecimento das conclusões e decisões tomadas.
Esta posição coloca de imediato duas questões.
A primeira é: serão os Chefes militares legítimos representantes dos cidadãos militares para as questões de âmbito socioprofissional?
No nosso entendimento, não serão! Pelo contrário! Os Ramos, enquanto entidades empregadoras, e os seus Chefes, entram numa situação de incompatibilidade por conflito de interesses, na discussão das matérias socioprofissionais, uma vez que sendo indigitados pelo poder político estão também comprometidos com quem os nomeia, cujo poder não espera dos seus nomeados qualquer oposição ou contrariedade.
Por outro lado, não se conhece disposição legal que confira aos Chefes militares essa competência de representação socioprofissional dos seus subordinados. No limite poder-se-ia até dizer que a longa lista de desastrosos danos e prejuízos provocados aos direitos e à Condição Militar, comprova a incapacidade dos Chefes militares para desempenharem esse papel de representação nas matérias socioprofissionais. Para além deste aspecto, também é fácil perceber para que lado tenderá a pender a sua posição sempre que são colocados entre o Governo que os nomeia e os militares que lhes estão subordinados.
A segunda questão, de igual importância, é: havendo uma Lei Orgânica que reconhece o direito ao associativismo profissional dos militares, aprovada por unanimidade na Assembleia da República, porque motivo a mesma não é cumprida pelo governo e Chefias militares?
Atentemos ao que está expresso no texto da Lei Orgânica nº 3/2001 de 29 de Agosto: “Artigo 2.º – Os direitos das associações As associações de militares legalmente constituídas gozam dos seguintes direitos: a) Integrar conselhos consultivos, comissões de estudo e grupos de trabalho constituídos para proceder à análise de assuntos de relevante interesse para a instituição, na área da sua competência específica; (…)” Que dúvidas subsistirão nas mentes dos sucessivos responsáveis políticos e militares, ambos obrigados ao cumprimento das leis, por compromisso de honra e por juramento, para que este direito das associações profissionais de militares, e dever de tutela política e militar, não seja cumprido ao longo dos últimos 23 anos?! O texto desta lei, pela sua clareza, ao contrário de muitos outros textos legislativos dotados de grande densidade, complexidade e necessidade de interpretação, não se acredita que deixe qualquer dúvida, até mesmo para os que possam ter dificuldades com a leitura de legislação. Aquilo que é um facto que a vida nos comprova, é que sempre que há algum nível de participação por parte dos interessados nas decisões a tomar, estas resultam mais sólidas e justas, estabelecendo laços de confiança entre as partes, essenciais para uma relação de trabalho permanente. De costas voltadas nenhuma das partes tem sucesso, as medidas a tomar serão sempre piores e mais vulneráveis à contestação. Posto isto voltamos à questão inicial, expressa no título deste comunicado:
Se os responsáveis políticos e militares não cumprem a alínea a) do artigo 2º da Lei Orgânica nº 3/2001, será falta de literacia ou falta de democracia?
Porque os Sargentos, para o serem, têm de saber ler e escrever e porque são defensores e respeitadores dos princípios e valores democráticos, resta-nos lutar, com todos os meios possíveis, para contrariar as desvalorizações funcionais, para lograr uma saúde compatível com a exigência da Condição Militar, para alcançar um regime remuneratório justo, revisto e actualizado que promova o reconhecimento do serviço prestado à Pátria pelos Sargentos de Portugal!
A Direcção

Consulta documento aqui.