“Reflexão em tempo de férias…”

Há uma semana, a 14 de Julho, na conferência “A nova Defesa”, o primeiro-ministro afirmou que Portugal vai investir mais 1300 milhões de euros até ao final do ano em defesa, através de três eixos: 1) manutenção e reforço do apoio à Ucrânia; 2) reforço das capacidades militares com a aceleração da aquisição de equipamentos e investimentos em infraestruturas; 3) reavaliação de investimentos que estão em curso e investimentos futuros de uso dual, ou seja, de utilização militar e civil.
Afirmou ainda que o objectivo é mais ambicioso na execução material do que financeira, destacando a dificuldade em adquirir rapidamente material não previamente encomendado.
“Generalidades e culatras”, como se diz no jargão militar! Sobre o factor humano, o mais importante de qualquer organização, nem uma tímida referência!
Dias depois, a 17 de Julho, no debate sobre “O Estado da Nação”, o primeiro-ministro afirmou: “queremos competir com os países mais desenvolvidos da Europa”, “Portugal é maior que os seus obstáculos”, “a nação realiza-se todos os dias… uma nação forjada na vontade de acontecer…” — muito bonito, mas?
Ainda neste debate, num tempo de cenários de guerra globais, com discussões sobre aumentos brutais no orçamento da Defesa, perante as insistentes e reais dificuldades de recrutamento e retenção onde cada vez menos efectivos dão resposta a cada vez mais missões, com grau de exigência cada vez maior, as Forças Armadas e os homens e mulheres que nelas servem não mereceram mais que apenas breves referências, vazias de conteúdo e de objectivos, como as de um deputado que, em sede de audiência com as APM na Comissão de Defesa Nacional, afirmou que, para o seu partido (o segundo ao nível de representação parlamentar), “os militares não são cidadãos”.
No dia seguinte, 18 de Julho, em entrevista à CNN Portugal, o ministro da Defesa declarou que quando o governo fala em investir nas Forças Armadas, fala em “muitíssimos meios” e equipamentos com “uso duplo”, o que se configurará como um enorme retorno para a população portuguesa.
Referiu ainda que as operações de emergência médica, busca e salvamento, transporte de órgãos, repatriamento, entre outras, são feitas com recurso às Forças Armadas. Mas com que efectivos, Sr. Ministro? Com que impacto nas condições e carga de trabalho dos militares em serviço?
É uma verdade que as exigências se multiplicam, mas os efectivos não se veem crescer!
E não se iludam os cidadãos com discursos sobre “quadros remuneratórios”, “suplementos” ou “investimento nas pessoas”! Os militares, infelizmente, conhecem bem a realidade que vivem, e o povo, de onde emanamos e a quem servimos, tem de a conhecer também!
Durante anos, os números de recrutamento e retenção caíram de forma consistente — porque se negligenciou o investimento no factor humano. Registamos que, finalmente, o ministro faz uso de um argumento que a ANS há muito defende junto de responsáveis políticos e militares: “Podemos ter os melhores equipamentos, mas sem homens e mulheres treinados, preparados e motivados para os operar, não teremos Forças Armadas.”
E quando afirma que “houve melhores números de recrutamento em todos os ramos” no final de 2024, não se estará a referir, por exemplo, aos 13 (sim, treze!) militares da Marinha que completaram a sua instrução básica já em 2025 e, há dias, juraram bandeira! Esta realidade não representa, com toda a certeza, esses “melhores números de recrutamento”.
Estamos em pleno período de férias (para quem as consegue gozar), mas este comunicado exige reflexão, porque a luta pelos nossos direitos e por melhores condições socioprofissionais não vai, nem pode ir de férias!
Quando a maioria dos cidadãos regressar à actividade, estaremos perante processos eleitorais — autárquicas em Outubro de 2025 e presidenciais em Janeiro de 2026 — e também com a discussão do Orçamento de Estado para 2026. Presumivelmente, tudo isto acontecerá num ambiente de silêncio ensurdecedor, por parte das tutelas, em torno da decisão do Comité Europeu dos Direitos Sociais no que ao direito das APM à representação e negociação colectivas diz respeito!
Estejamos atentos e disponíveis para participar activamente, com confiança, determinação e unidade, nas iniciativas que vierem a ser convocadas.
Boas férias, sim — mas com reflexão.
Porque a luta, essa… não tira férias!
A Direcção

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