OE2024 – Uma Primeira Análise!
O Governo apresentou a proposta de Orçamento do Estado para 2024 (OE2024) no passado dia 10 de Outubro. Passada uma semana, feita uma primeira análise, ressalta que este OE2024 volta a não responder à questão central, pois não só não recupera o que foi perdido em 2023, como acentua a perda do poder de compra para 2024, tendo em conta que o corrente ano, e muito previsivelmente o próximo, serão marcados por um brutal aumento dos preços que degradam o poder de compra dos cidadãos em geral, onde se incluem os militares. O Governo insiste em não apresentar nenhuma causa a nível interno enquanto os cidadãos vivem cada vez pior e as famílias são asfixiadas com galopantes taxas de juros do crédito à habitação. A inflação, em 2022, fixou-se em 7,8%, mas se tivermos em conta os aumentos dos preços dos produtos alimentares, foi realmente de 13% e até Agosto de 2023, incluídos os produtos alimentares, então atingiu os 15%. A prestação média da habitação (crédito) aumentou mais de 40% até Julho de 2023; as rendas aumentaram 9,4% e os custos com energia e combustíveis continuam a pressionar as famílias. É perante este cenário que o Governo diz valorizar a redução das taxas de IRS e os aumentos salariais. Porém, estas medidas, sendo positivas, estão longe de assegurar aumentos acima da inflação, o que contraria o sentido do discurso aquando da apresentação deste OE2024. Apesar do Governo afirmar que este é um orçamento que reforça os rendimentos tal não corresponde à verdade, pelo menos para os que servem o Estado como, por exemplo, os Militares. Este OE2024 não pode ser visto nem analisado de uma forma desligada do OE2023 que, recordamos, promoveu uma acentuada perda do poder de compra. No OE2023 o Governo apresentou, para os trabalhadores em Funções Públicas, um aumento mensal de 52,11€ nos salários base, sendo também garantida uma valorização de, pelo menos, 2%, dizendo que “este esforço garante uma actualização salarial média de 3,6%”. Com as progressões e promoções (que já eram devidas) o Governo chegou a um “aumento” de 5,1%. Ou seja, os ditos aumentos não repuseram sequer o poder de compra perdido nestes dois anos (2022 e 2023). Em bom rigor, não houve aumentos, mas sim uma mitigação da perda do poder de compra! Já quanto ao presente OE2024, o Governo refere que todos os trabalhadores das Administrações Públicas terão um aumento de pelo menos 52,63€ ou 3% por mês. Refere o Governo que, com os aumentos salariais que “acrescem à subida da base remuneratória da Administração Pública para 821,83 euros, às promoções, às progressões (que irão beneficiar dos aceleradores), e às restantes variações remuneratórias (por exemplo, nas ajudas de custo e subsídio de transporte), no total, a massa salarial aumenta 5,5%”. Ora, se tivermos em conta a inflação verificada em 2022 e 2023, fica demonstrado como este OE2024 falha na protecção dos rendimentos dos cidadãos que servem o Estado Português. Estes aumentos são manifestamente insuficientes face ao aumento do custo de vida que se verificou em 2023 e que se manterá, provavelmente, em 2024. Contudo, na apresentação deste OE2024, o Governo afirma que “Portugal irá assegurar os compromissos assumidos com os seus Aliados e parceiros, nomeadamente, através da projecção de Forças Nacionais Destacadas para o flanco leste da NATO, e no apoio aos esforços de resistência da Ucrânia, dentro das capacidades existentes”. É também referido no documento que se irá proceder a uma “melhoria contínua da sustentabilidade do modelo de prestação de serviço militar e da conciliação do trabalho com a vida pessoal, prosseguindo o Plano de Acção para a Profissionalização do Serviço Militar (PAPSM) e o Plano Sectorial da Defesa Nacional para a Igualdade”, e que será prestada “uma atenção especial ao estudo e à adequação dos mecanismos de recrutamento, retenção e reinserção, onde se destaca a consolidação do Quadro Permanente de Praças no Exército e na Força Aérea, após a sua recente criação, assim como do Regime de Contrato Especial, para responder às necessidades de qualidade e quantidade de efectivos para as Forças Armadas”, para além de afirmar que “será dada atenção às políticas de reinserção profissional, com recurso a políticas activas de formação e de emprego. Será também essencial garantir a continuação do alinhamento da formação conferida pelas Forças Armadas com o Sistema Nacional de Qualificações”. Ora, o anunciado poderá até nem estar mal, mas o que falta, de facto, são as medidas concretas! Na verdade, e apenas a título de exemplo, não deixa de ser escandaloso que se refira a necessidade de conciliar a vida profissional com a vida pessoal e familiar e ao mesmo tempo, no terreno, essa conciliação é afastada por sucessivas missões e tarefas, para as quais o Ministério não tem recursos humanos, e que sobrecarregam cada vez mais “os mesmos” levando à saída de muitos, seja pelo inusitado número de pedidos de abate aos quadros permanentes, seja pela rescisão antecipada dos contratos ou seja por outros meios possíveis. Quanto à Lei de Programação Militar (LPM), não há propriamente novidades. Em 2024, dos projectos estruturantes para as missões de soberania e de interesse público destaca-se “a aquisição de meios navais e aeronaves e a ampliação das responsabilidades e meios de Ciberdefesa, financiadas pela LPM. Serão desenvolvidas novas capacidades, alavancadas pela Estratégia da Defesa Nacional para o Espaço e pela Estratégia Nacional de Ciberdefesa, permitindo assim responder às ameaças que decorrem da crescente interconectividade e digitalização da sociedade”.
Na estrutura da despesa, 40,9% são despesas com pessoal. No ano passado, a despesa com pessoal atingia os 44% e 27,9% eram para aquisição de bens e serviços. O investimento representa 24,7%, um aumento face aos 19,6% previstos em 2023 e que significaram mais 2% face ao ano de 2022 do total da despesa. O Ministério destaca ainda a afectação às remunerações na Reserva de cerca de 86,9 milhões de euros. Qual a verdadeira intenção deste destaque?
Como se pode verificar, o OE2024, à imagem do que foi o orçamento do ano anterior, é muito parco em respostas concretas para os problemas que as Forças Armadas e os Militares enfrentam.
Se analisarmos o articulado da proposta de lei onde constam as alterações legislativas, podemos constatar que as referências e medidas quanto às Forças Armadas são praticamente inexistentes. No artigo 3º (utilização condicionada das dotações orçamentais) o HFAR é excluído do seu âmbito de aplicação. No artigo 36º, a ADM é excluída dos limites de encargos de aquisição de serviços.
E, tanto quanto conseguimos escrutinar, não há qualquer referência quanto aos montantes para o propalado aumento do suplemento de condição militar, nem no relatório nem no articulado, sendo que poderá vir a ser explicitado no orçamento detalhado do Ministério, que ainda não foi entregue.
Assim, o Orçamento do Estado para 2024 volta a não contribuir, no plano concreto, para a resolução de nenhum dos grandes problemas que existem nas Forças Armadas. Nele não se encontram respostas para a degradação do poder de compra dos Militares, não há medidas concretas para a falta de efectivos e para a reduzida atractividade das Forças Armadas; não se encontram respostas para os problemas socioprofissionais; não se encontram soluções ou respostas para os problemas que se vivem no Instituto de Acção Social das Forças Armadas (IASFA) nem para a necessidade de resolver o problema estrutural que existe neste Instituto.
Importa aqui lembrar que no ano passado foi manifestada uma abertura no OE2023 para uma revisão das carreiras dos Militares das Forças Armadas. Tanto quanto sabemos, nada avançou quanto a este assunto. Nem tão pouco se resolve o problema dos cortes operados nas pensões de “sangue” e na aplicação aos Militares do Decreto-lei nº 503/99, de 20 de Novembro.
Face ao exposto nesta primeira análise, cabe questionar:
– No OE2023 foi anunciada a intenção da revisão das carreiras dos Militares das Forças Armadas. Um ano passado, quais foram os desenvolvimentos neste processo?
– Quais as medidas, em concreto, para a resolução da falta de efectivos? Qual foi a dimensão das saídas de Militares das Forças Armadas nos últimos dois anos? Que medidas foram adoptadas para a retenção dos Militares nos quadros permanentes?
– Qual a solução institucional para o problema existente no IASFA/ADM, com necessidade de o Estado assumir as suas responsabilidades nos cuidados de saúde, com cariz fortemente operacional, e devolver aos militares a gestão do IASFA?
– Para quando a exclusão dos Militares do âmbito de aplicação do Decreto-lei nº 503/99, de 20 de Novembro, repondo assim os montantes pagos a título de pensão por morte? – Para quando o merecido respeito pela dignidade e pela Condição Militar daqueles que servem Portugal nas Forças Armadas?
A Direcção
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